Após cerca de nove horas de trabalho na oficina, o pintor de carros Renato Domingues Aureliano, 28 anos, pega o carro e vai para onde o destino o mandar. Na verdade, para onde o passageiro o mandar, já que, das 20h à meia-noite, ele é motorista da Uber.
A dupla jornada começou há mais ou menos um ano, depois que Aureliano comprou um carro financiado. “As parcelas estavam altas e, como eu tinha amigos que trabalhavam na Uber, achei que era uma boa ideia entrar para conseguir um dinheiro a mais e ajudar a pagar a dívida”, contou ao “Agora”.
O pintor de carros não se arrepende, porque, além do prazer de dirigir, a grana ajuda a pagar o financiamento e outras despesas pessoais.
De acordo com a Uber, cerca 50% dos motoristas do aplicativo no Brasil usam a plataforma para elevar a renda.
O caseiro Damião Cadete, 36 anos, faz parte dessa estatística. “Trabalho em uma casa de família e, à noite, saio para complementar a renda com a Uber. Estava com dívidas no cartão de crédito e vi como uma oportunidade de aumentar o que ganho para pagá-las”, contou.
Mas a grana extra não vem sem esforço. Cadete conta que, por cerca de três meses, o trabalho como motorista ia das 17h até 23h, em média, durante a semana, e das 14h às 23h nos finais de semana.
Agora que ele já quitou a dívida, a rotina na Uber está mais leve. “Estou trabalhando de acordo com minha disponibilidade. O que ganho é mais um extra mesmo.”
Para avaliar os ganhos, os motoristas devem colocar todos os gastos com o carro na ponta do lápis. A empresa cobra uma taxa pelo uso do aplicativo, de 25% por viagem para UberX.
Os dias mais lucrativos, na avaliação dos motoristas, são os finais de semana, especialmente as noites de sexta e sábado. “Se não tenho nenhum trabalho na oficina no sábado, viro a madrugada de sexta para sábado e, em geral, viro de sábado para domingo”, revela Aureliano.
Para entrar na Uber, é preciso ter o registro para exercer atividade remunerada na carteira de motorista e apresentar a documentação do carro. Antes de aceitar o colaborador, a Uber também confere antecedentes criminais.
Especialista recomenda intervalos na rotina
Para minimizar os efeitos da dupla jornada, o motorista deve fazer pausas de 10 minutos com certa frequência. “O ideal é usar o momento para inspiração e reflexão”, afirma Fernando Akio Mariya, diretor da ANAMT (Associação Nacional de Medicina do Trabalho).
A recomendação da OIT (Organização Internacional do Trabalho) é que o trabalho não exceda 40 horas por semana para não prejudicar a vida do profissional.
Segundo Mariya, as horas excessivas de trabalho podem causar alterações do sono, fadiga, transtornos mentais, doenças cardíacas, problemas de estômago e alterações reprodutivas.
“A produtividade e a eficiência também diminuem, pois o encurtamento do período de sono também se mostrou associado a um aumento nos erros e acidentes nos trabalhadores de transportes”, alerta o especialista.
Por outro lado, entre os motoristas, a liberdade de fazer o próprio horário é umas das principais vantagens do trabalho.